Saber que a vida na telinha é filtrada não te torna imune à mensagem.
Como sair do Instagram? Não dá. É impossível. Vamos todos morrer com inveja da vida perfeita dos outros.
Ok, vamos lá. Como alguém que conseguiu sair de tudo quanto é rede social… QUASE. Quase consegui, com mais recaídas do que eu gostaria de admitir, mas enfim.
Meu amigo Ângelo mandou uma newsletter contando das tentativas fracassadas ao tentar sair do Instagram. Pensei em responder para ele com algumas dicas, mas percebi que seriam ridículas e repetidas.
Tudo o que posso fazer é comentar minha experiência de sair das redes sociais e das recaídas. É que gasto neurônio demais pensando sobre essa coisa de ficar na Internet, redes sociais, e sobre por que raios as mentes mais brilhantes da nossa geração estão tentando fazer aumentar o número de cliques em anúncios em vez de, sei lá, inventar ônibus menos poluentes.
Ângelo escreve:
Adoro ver os updates dos meus amigos, mas já estou perdendo a mão — especialmente porque esse app é um gatilho para minha solidão e alimenta minha depressão. Não quero ser lembrado de como todo mundo tá feliz e acompanhado enquanto eu me sinto só e miserável — mesmo que essa não seja a verdade.
Existe uma distância entre saber que a vida ali no Instagram é falsa; e conseguir se livrar do filtro de verdade. Acho que é muito difícil não internalizar pelo menos parte da mensagem, até porque ninguém olha o feed gritando “MENTIRA!” “EU SEI QUE ESSE SOL AÍ NA PRAIA FOI SÓ QUINZE MINUTOS, DEPOIS DEU O MAIOR CHUVÃO!” e “OLHA ESSE FILTRO, MENINA, TUA CARA NÃO É ISSO NÃO!”
Ninguém faz isso, a sensação que fica é “e daí que tem filtro? Tá bonita, e eu que nem com filtro?” ou “tô sabendo que brigou com o namorado, mas pelo menos tá na praia”. A gente é muito melhor em se atirar pra baixo do que colocar a vida do outro em perspectiva.
Saber que aquilo tudo no feed tem um baita filtro ajuda, mas não resolve. O meio ainda é a mensagem.
Sabe o que me deixa puto? O capitalismo tardio, cara.
Porque dava pro Instagram ser um lugar legal. Aliás, o Instagram (e várias redes sociais) já foram espaços acolhedores, onde você encontrava as fotos das suas pessoas favoritas, trocava ideia com amigues, fazia parte de uma comunidade legal.
E, de repente, aquela rede está uma merda, mas você ainda acha que frequenta o mesmo barzinho descolado de anos atrás, até que um dia você percebe que a comida tá horrível, e cara, por que tá todo mundo de pé e nem tem mais cadeira nessa merda e quem expulsou a banda e deixou aquele locutor no palco gritando oferta de passagem de avião?
Não vou fingir que entendo de teoria de redes, mas a versão simplificada é óbvia: quanto mais amigos seus utilizam determinada rede social, maior o valor (e, inversamente, maior o custo social de se ausentar dela). Sabendo disso, quanto maior a rede, maior o incentivo para gerar dinheiro para acionistas, uma vez que as pessoas não vão abandonar o rolê onde encontra sua patota. Mais anúncios, cada vez mais intrusivos, até o ponto em que fica quase impossível acompanhar qualquer um dos seus amigos. Cory Doctorow chama esse processo de enshitification. Se você lê inglês, recomendo este artigo.
Um tempo atrás eu estudava comprar um dumbphone, termo chique para aquele celular nokia velho que só tem sms e jogo da cobrinha, por motivos de eu me distraio muito fácil. Resolvi fazer um teste e desinstalei tudo o que era possível no Android e bloqueei o que dava. Até descobrir que, no Brasil, não tem como viver sem whatsapp. Esse trem já é mais importante do que a rede de telefonia celular, já que sem ele você não consegue falar com fornecedores, resolver pendências, nem negociar nada, e, em muitos casos, nem pedir uma pizza. Nope, um celular sem whatsapp está mesmo fora de cogitação a menos que eu me torne um ermitão (talvez não seja má ideia).
É por isso que é tão difícil abandonar o Instagram. Ou o Twitter. Ou qualquer rede onde você consegue ser social. É lá que a gente existe, né?
Aí a gente cai em uma bifurcação. Abandonar de vez ou estabelecer regras para o uso das redes sociais. A primeira opção é sempre mais interessante, MAS
- Se você trabalha com marketing, não vai conseguir abandonar de vez.
- Se você é um artista independente ou criador de conteúdo, é difícil encontrar outros canais de divulgação.
- Se você é expatriado e quer manter vínculos com seu país de origem, você não vai querer cortar os laços.
- E vários outros cenários…
É difícil dizer que abandonei de vez as redes sociais, não só pelas recaídas, mas porque tenho um negócio em formação cuja divulgação depende de redes sociais. Muito louco.
Já tentei criar todo tipo de regra, mas exigem disciplina, e as redes sociais estão tentando (e conseguindo) burlar a sua força de vontade o tempo todo. Quer seguir pouca gente? Vamos inundar o seu feed com sugestões de posts que talvez você goste. Quer controlar o tempo no aplicativo? Vamos mandar notificações de coisas interessantes acontecendo um minuto antes de acabar o tempo que você determinou. Quer bloquear os reels? Não, nope, não tem como. Inclusive, deixa eu mover ele aqui para o meio dos posts para viciar um pouco mais.
Quanto mais complexas e ridículas as regras que eu estabelecia, mais cansativo tentar segui-las.
Acho que só consegui sair das redes sociais porque tenho péssima autodisciplina. Parece contraditório, mas escuta. Tenho o foco de um gatinho recém nascido numa piscina de bolinhas de pompom. Minha família já sabe que é difícil falar comigo se tem uma TV ligada. Quando vou a bares, sempre tento ficar de costas para a TV, porque sei que vou ficar olhando para a tela, independente do que estiver passando (odeio bares com telas em todas as paredes). Não tem nada a ver com a programação. Pode ser até TV Senado. Jogo de futebol da terceira divisão. Campeonato de Curling. Se tiver movimento, já era.
Agora imagine como é tentar resistir a sequências de vídeos de 10 segundos com cortes rápidos? Eu não tenho nenhuma defesa contra Reels, Tik tok ou Shorts. Sou capaz de passar horas vendo essas porcarias.
E aí a gente já tem um problema semântico. Não acho que exista um problema em acompanhar o que está rolando entre os amigos, seguir gente bacana, artistas com projetos incríveis. Inclusive isso pode até fomentar um senso de comunidade, de interação com pessoas finíssimas. Mas é muito difícil usar a rede social assim, porque o feed não tem fim. A rede vai inserir conteúdo patrocinado, conteúdo viral e todo tipo de coisa para te manter ali, com os olhos colados na tela. E esse conteúdo a mais muitas vezes vai ser aquele que te pega pelo pé: um pouco mais intransigente do que você gostaria, aquilo que vai deixar você irritada, incomodada, navegando mais. Ojeriza, veja só, é uma forma muito efetiva de prender a atenção.
A desgraça da rede social é que, apesar de tudo, tem muita coisa boa. E muito lixo. As moedinhas brilhantes vêm em intervalos aleatórios, comportamento estudado há décadas em máquinhas caça-níquel. Recompensa intermitente é irresistível. Igual drogas: a primeira vez é tão excepcional que o usuário passa a vida tentando buscar o mesmo barato, o mesmo êxtase, e não tem nada mais viciante do que aquilo que quase funciona.
Sem querer fazer falso paralelismo entre dependência química e usar mais o Instagram do que deveria, alguns princípios de comportamento humano se aplicam a ambas as situações (claro, em escalas diferentes).
Então, a primeira regra é que você só sai do Instagram se você quiser sair do Instagram. Parece idiota, mas ninguém vai arrancar o celular da sua mão. Se eu, meio que, às vezes me incomodo, e, sei lá, talvez eu não devesse usar, esquece. Acho que esse é o ponto difícil com adolescentes. Largar redes sociais tem que ser um processo por iniciativa própria. (“Adolescentes e redes sociais” merece um artigo inteiro, até porque esta é a época de criação de vínculos/grupos/turmas/comunidades, e isso também acontece em espaços virtuais; bloquear o acesso de humanos em formação a esses espaços não costuma dar bom.)
Olha eu falando como se inocentes vídeos brilhantes fossem o pior monstro da face da Terra! Então deixa eu separar dois parágrafos para pregar a palavra contra Big Tech. Na real, acho que as redes sociais são tanto causa quanto sintoma do agravamento da solidão no mundo. Mas o esgarçamento das relações sociais nunca vai ser resultado de uma coisa só, e bom, a gente está numa cultura que passou os últimos 60 anos colocando como ideal a ser atingido uma vida cada vez mais independente, solitária, você na tua casa de condomínio sem saber o nome de nenhum vizinho. Tudo isso enquanto você almeja reconhecimento. Como vai conseguir reconhecimento se ninguém te conhece?
Buscar reconhecimento é um motivador primordial humano, vide a criança gritando “pai, pai, paaaai, olha, ooolha, oooolhaaa!” É o que fazemos como adultos em redes sociais também. Em outras culturas que não capitalismo tardio essa busca natural por reconhecimento pode tomar outras formas: ser visto como participante ativo da comunidade, pessoa generosa, sábia, um bom amigo, enfim. Talvez seja mais difícil de medir do que o número de seguidores.
Na real, sou cheio de discursinho, mas não foi por causa do capitalismo que saí das redes sociais. Foi porque aprendi a olhar para mim. A enxergar que aquilo não estava fazendo bem para mim.
Já falei que tenho a disciplina de uma criança de cinco anos num festival de sorvete, né? Então, nas épocas que estou usando Instagram, começo com uns minutinhos por dia, que viram minutões, que viram horas, e quando percebo estou olhando vídeos idiotas que nem me deixam feliz enquanto finjo brincar com minhas crianças. Cara, tem tanta coisa errada nisso.
As duas chaves aqui são “minhas crianças” e “nem me deixam feliz”. Meus filhos só vão ter quatro e seis anos uma vez na vida. E embora essa fase tenha sim, comportamentos bem desafiadores que te fazem querer fugir para uma tela para não ter que lidar com aquela birra de novo ou ouvir a música da Moana (eu sou moooooaaaaanaaaaaa) pela vigésima vez. Nos momentos em que consigo olhar para meu comportamento com um pouco de sanidade, eu me odeio por estar no celular em vez de estar de verdade com eles. Não é um julgamento externo, mas interno.
E é até contraprodutivo, porque quando você dedica de verdade a sua atenção para as crianças, elas tendem a colaborar muito mais, torna o dia mais leve e mais fácil. Se as crianças estão irritadiças, é batata, as telas em excesso vão estar em algum momento do dia. Ou estou demais no celular (às vezes resolvendo coisa de trabalho no whatsapp, às vezes nas tais redes sociais), ou a horinha de TV delas virou duas horinhas.
O segundo ponto é que redes sociais não me deixam feliz. Não de verdade. É como comer um pacote inteiro de batata frita industrializada, você fica de barriga cheia, mas não foi uma refeição, sua boca agora está picando com o sal e muitas vezes não foi nem… gostoso. Eu tenho essa sensação, uma estafa, uma sensação esquisita. Então o que faço é prestar bastante atenção nessa sensação, tentar localizar ela no corpo. Para mim ela tem cara de um peso no ombro, o pescoço meio torcido, a respiração rasa. E a cabeça irritadiça, como se qualquer tarefinha fosse algo muito, muito chato, uma desvontade de viver.
Prestar atenção a essa sensação, conhecê-la bem, é muito útil para conseguir resistir e não voltar. Quando bate aquela vontadezinha de instalar o Instagram de novo, tento lembrar (e até reviver) essa sensação ruim, para que meu corpo associe as duas coisas. Não funciona sempre, mas ajuda.
Aprendi esse truque no podcast do Ezra Klein ano passado, numa parte em que ele fala sobre comer pizza demais:
But I’ve known forever that if I’m out and people order pizza, I will have five or six slices and I will feel sick. And I actually to some degree avoid those events, because I know I will feel bad.
(Mas eu sempre soube que se saio e as pessoas pedem pizza, comerei cinco ou seis pedaços até me sentir mal. E, na verdade, até evito esses eventos, porque sei que vou me sentir doente.
A resposta do entrevistado, Jud Brewer, é curiosa:
So there’s a real difference between our thinking brains and our feeling body. So the key here is really focusing like, ooh, what was that like last time? (…) We have to elicit the feeling. We’re trained to think using our thinking brains, really trying to think through things. Yet that’s not really what drives behavior.
(Então, há uma diferença real entre o cérebro pensando e o corpo que sente. A chave aqui é focar, de verdade, ooh, como foi da última vez? (…) Precisamos trazer o sentimento. Estamos treinados a racionalizar, a pensar as coisas. No entanto, isso, não é o que move o comportamento.)
Esse truque tem funcionado, também com outro vício idiota que tenho, chamado cotonete. Enfiar um cotonete no ouvido é um barato beeeem bom, mas cara, é MUITO RUIM, sério, e até perigoso (e dado que já tenho um ouvido com surdez parcial, convenhamos). Mas reparei que sempre que uso um cotonete, vou ter dor de cabeça dois dias depois. (Placebo? Superstição?) Sempre que dá vontade de pegar um cotonete, eu me esforço para realmente sentir aquela dor de cabeça, que é bem específica, chegando. Tem sido muito efetivo associar as duas coisas, e esse é um vício que estou abandonando (com recaídas, infelizmente).
Voltando às redes sociais. Quem sou eu na fila do pão pra dizer se e como sair delas? Só consegui me livrar do Twitter graças ao tio Elon, e só quando ele trocou o símbolo do passarinho por aquele cachorro Doge, depois de uma série de pataquadas e atentados ao bom senso. Aquele cachorro foi um símbolo bem claro de “aqui é o MEU parquinho”, e foi o suficiente para eu, que já estava com um pezinho para fora, fechar o site e perceber que não queria participar disso. Não queria escrever naquele site.
É até curioso que na época eu estava começando a estruturar uma narrativa em 120 twítes, que acabei abandonando.
É meio paradoxal que eu só tenha conseguido sair do Instagram porque ele me vicia de verdade, e vejo o tempo drenado para o ralo. Mas existe outro motivo pelo qual passamos tanto tempo ali naquela rede social: porque ela está cumprindo um papel de substituir a sua vida social, talvez?
Porque, sendo sincero, é chato não saber quando amigo meu lança livro novo, vai cantar num boteco ou aprendeu a tocar ukulele.
Por que você abre o Instagram? Em que momentos da sua vida? Qual é o sentimento que faz você pegar o celular, se jogar no sofá e rolar, rolar, rolar?
Em um episódio de Sense8, Kala, a empresária bem sucedida pergunta a Capheus:
Kala Dandekar : The first time I went into a house like this in Bombay they had no beds, but they had a television as big as this. I mean, how can a TV be more important than a bed?
Capheus : Ah, that’s simple. The bed keeps you in a slum. The flat screen takes you out.
(Kala: A primeira vez que entrei em uma casa assim em Bombay eles não tinham camas, mas tinham uma televisão tão grande quanto essa. Assim, como pode uma TV ser mais importante que uma cama?
Capheus: Ah, é simples. A cama te mantém na favela. A tela plana te leva pra fora.)
Acho que estar todo mundo viciado em Instagram, TikTok ou qualquer outra rede social é também um sintoma da vida merda que a gente está vivendo no capitalismo tardio. Quando a nossa cultura nos empurra para vidas cada vez mais nucleares e individualistas, para felicidade rasa pelo consumo, a telinha vira um jeito de tentar fugir da realidade que a gente vive.
Se um em cada quatro brasileiros tem menos que um amigo, não surpreende o vazio que a gente tenta preencher com rede social. Quer dizer, o sofrimento é real. Instagram não é a solução. (Embora, sim, o Instagram pode, em alguns casos, ser um primeiro passo para se conectar com as pessoas, na prática, acredito que é mais difícil fazer um amigo curtindo fotos e trocando meia dúzia de direct do que chamar para um café.)
Não adianta apagar o Instagram do celular e ficar olhando para a parede. Você precisa arrumar outra coisa para substituir aquela carência.
Quando apaguei o Instagram tive a fase de sites de memes. Até eu conseguir perceber que aquilo não me fazia feliz, e, novamente, eu me odiava por olhar memes em vez de estar com as pessoas que amo. Bloqueei os sites. Aí num momento de tédio descobri os Shorts, vídeos curtinhos no Youtube. Tive que apagar o aplicativo do Youtube do celular.
Sim, essa minha briga de gato e rato contra a tecnologia vai ficando cada vez mais ridícula. Inclusive esposa acha besta essa minha mania de insistir em não ter certos aplicativos no celular e vários sites bloqueados. Eu me conheço, sou muito ruim em resistir a eles. Mas tenho disciplina suficiente para lembrar por que foi que os apaguei e não baixar de novo (na maior parte do tempo. Às vezes a cabeça não está boa e me rendo a uma injeção de reels na veia. E recomeça o ciclo).
Sabe no que sou viciado? E-mail. Vai, eu espero você parar de rir.
Optei por concentrar todo o meu consumo de conteúdo no e-mail. É ali que assino as newsletters, é para aquele e-mail que envio os links interessantes que salvo para ler ou ver depois. É ali também que uso o bom e velho RSS para assinar vários blogs, sites e perfis de artistas e criadores de conteúdo que sigo.
O bom é que e-mail é meio merda, e principalmente, não tem nenhuma recomendação algorítimica de conteúdo. Uma hora acaba as newsletters para ler e os posts novos do dia. Como tenho a decência de não assinar tanta coisa assim, em meia hora eu já estou olhando para a parede, respirando fundo e “bora trabalhar”.
Sabe o que me mata? Quando encontro algum artista novo pelo qual me apaixono, às vezes passo horas lendo tirinhas, descobrindo o trabalho. O bom é que, ao contrário de algoritmos, a produção é finita. Aí só me resta esperar uma atualização por semana, como todo mundo.
Curioso, apesar de isso ocupar um tempo grande, explorar o trabalho de um artista não me deixa com a sensação de tempo perdido, e sim de um tempo aproveitado.
Mas divago.
Nessa hora também podemos entrar numa pergunta que você, minha leitora mais nerd, possa estar se fazendo: e outras redes sociais, que não as grandes e vorazes idólatras do algoritmo? Estamos falando de Mastodon, Reddit, grupos no Telegram e Whatsapp, comunidades independentes com sistemas próprios, enfim.
Sobre essas, não tem como atirar tudo no mesmo saco, porque elas não têm o mesmo sistema de incentivo das Big Tech (mais usuários, tempo, anúncios, engajamento, dinheiro. O parquinho de sempre do capitalismo). Então tudo depende de como funciona o sistema de incentivo de cada rede, tamanho, ou da sua relação com a rede, com aquela comunidade.
Acho que a pergunta chave aqui é “aquela rede te faz bem?”. E isso vale também para redes sociais grandes, o Twitter por muitos anos me fez muito bem, me fazia sentir parte da comunidade de escritores de ficção científica e fantasia brasileiros. (Na real, começou a desandar mesmo quando passou a empurrar para a timeline tuítes de pessoas que não optei por seguir).
A gente precisa aprender a perceber o nosso próprio corpo. Telas, em geral, acabam trazendo todo o foco para a mente, para o racional, mas, às vezes, o nosso corpo responde melhor à pergunta. A rede te traz ansiedade? Relaxamento? Risadas? Inveja? Você sabe como isso se manifesta no seu corpo?
Tem também o tempo, né? Essas redes, essas comunidades, são grandes? Pequenas? Qual o volume de conteúdo novo por dia? Você acha que o tempo dedicado a elas é recompensador?
E se você perceber que a rede não te faz bem e decidir cortar o Instagram da sua vida, você vai ter que ocupar esse tempo aí de alguma forma. Se você passa uma hora por dia, é uma hora a mais para você. Se deixar um vácuo de tempo, os hábitos antigos te sugam de volta.
Eu diria que o melhor é ocupar esse tempo aí de alguma forma social. Indo tomar um café com uns amigos, indo pra quadra jogar bola, sair para andar e ver gente, e de repente aproveitar algum parque, uma praça que valha à pena. Começar a malhar, fazer aula de spinning, pegar um hobby, redescobrir o tricô enquanto você ouve de novo a discografia completa da sua banda favorita.
No meu caso é fácil, pois, crianças. (E também que tenho um milhão de hobbies pela metade sem tempo para nenhum deles).
Você pode aproveitar esse tempo para ler a pilha de livros na cabeçeira, mas aí recomendo pegar um livro BÃO, daqueles que te agarram pela gola da camisa e não te soltam até a última página, como o incrível Mariposa Vermelha, da minha amiga Fernanda Castro. Porque é difícil retreinar a mente a ficar várias páginas entre cada recompensa.
E claro, estabelecer regras e truques ajudam. Não seguir pessoas demais. (Às vezes nem de menos, já que a rede vai enfiar anúncios e conteúdo sugerido se achar que é pouco). Seguir pessoas que te fazem bem, em vez de perfis que alimentam seu asco. Não ter o aplicativo no celular. Ou colocar o celular em preto e branco. Usar bloqueadores, como o Freedom, o Leechblock, ou outros, como o sistema de bem-estar digital nativo do próprio celular.
A verdade, quase quatro mil palavras depois, é que eu não sei te ensinar a sair do Instagram. Eu só consigo falar da minha relação conturbada com essa rede social, da qual nem saí de verdade. Ainda volto ali, de vez em quando. Uma ou duas vezes por semana, e nunca por mais de quinze minutos. Acho que consegui estabelecer uma relação saudável com ela. Pelo menos por enquanto. Eu me conheço, em algum momento vou acabar voltando, usando mais, bloqueando tudo de novo. Deixa ser, deixa a roda girar.
Celulares e redes sociais são ferramentas que usamos para mediar a nossa relação com o mundo. Mas se não tomarmos cuidado, acabamos usados pela ferramentas, ou melhor manipulados pelos interesses das corporações à quem essas ferramentas servem. Não se trata só de “resistir”, mas de criar novos meios de interagir com o mundo.
Talvez menos digital e mais corpo. A gente não é só uma cabeça pensante com um dedão deslizando, afinal.
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📷Foto de Gian Cescon