Quando você vier comer pizza na minha casa, você traz a sobremesa. Você vai chegar às cinco com vontade de sujar as mãos de farinha.
Vai cortar o brócolis, o alho poró, os tomates, e vou mandar as crianças buscarem o manjericão na horta. Você vai pegar o queijo na geladeira e começar a ralar sem cerimônia porque você sabe que eu não me importo que fuce os armários para achar o ralador.
Vou abrir um vinho para nós, ou você vai beber uma cerveja, ou farei caipirinha com limões do quintal. E vamos brindar sorrindo, lembrando com saudade daqueles que queríamos aqui conosco. E você vai dizer “sabe da última do b…”, mas vou te interromper porque não falamos esse nome nesta casa. Não hoje. Hoje é dia de pizza.
Vamos colocar as redondas para assar no forno, uma delas vai cair no chão, como sempre, e faremos aquela piada do sacrifício. E vou tirá-las do forno, enquanto você corta e distribui para as crianças, sempre as primeiras a aparecer. Hoje não tem de calabresa e você vai dizer que não sou mais o mesmo desde que virei vegetariano.
De barriga cheia de pizza e sobremesa, vamos puxar as cadeiras para o gramado, a noite está quente, todas as noites são quentes agora. E ao reparar que você tem mais um pedaço de pizza na mão, vou considerar um elogio.
Vamos olhar o céu estrelado e com um pouco de sorte veremos a fileira de satélites rasgando o céu como estrelas cadentes.
Veremos as crianças correrem com os cachorros atrás de galinhas pelo pomar, tropeçando em galhos caídos no chão, ralando os braços em arbustos espinhosos, vivendo as criaturas selvagens que são.
Quando foi que deixamos os espinhos bloquearem nosso caminho? Você vai perguntar como pudemos deixar o mundo como está, mas essa não é a pergunta certa. Como a gente conserta?
A gente começa deixando as crianças dormirem mais tarde, com pizza para os amigos e um bom café, e vou colocar a cafeteira no fogo.
Quando você vier comer pizza na minha casa, conversaremos sobre a vida, beberemos café e começaremos a consertar o mundo, um sorriso de cada vez.