Rodrigovk
Escritor, faz-tudo, editor e pai

Padrão Mental Reacionário [Egotrip]

O problema da Indignação é que vicia. Empacotada em posts de consumo rápido nas redes sociais, é receita para… Para tudo isso que tá aí.

Estive matutando sobre um argumento do Eduardo Fernandes em seu podcast “Treinamento para ser reacionário“. Reconstruindo aqui de memória: você vê o presidente falando besteira na televisão, e tem uma reação. Desgosto, revolta, indignação.

Você reage, cada vez de forma mais automática,criando um padrão, um hábito.

Esse padrão é capitalizado por algumas estruturas que se aproveitam desse sentimento para o lucro, ou para projetos de poder.

Eduardo chama a atenção para o momento da observação, ou melhor, da auto observação. Uma forma de tirar a mente do piloto automático é justamente perceber esse momento de indignação se instaurando, enquanto observa os mecanismos que o provocam. Que muitas vezes estão na edição, na escolha de palavras, na construção daquele bit cultural em busca do desejado asco.

O que eu gostaria de acrescentar a essa discussão são alguns efeitos, talvez escondidos, dessa tal indignação. Por que será que esse negócio, esse padrão, vicia tanto?

Um dos efeitos colateral desse e de outros sentimento ligados ao asco, é que eles não permitem nuances, não permitem uma desconstrução, a análise do fato. Só existe uma única reação possível. Sem nuances não existe diálogo, só reforça o sentimento de nós contra eles”. Que no cenário posto, é sempre pregar para convertidos. Ou, em palavra mais polêmicas, sinalizar virtudes, mostrar ao mundo que você está do lado certo.

Tenho a sensação de que é aí que mora o perigo. Ao mesmo tempo que a indignação é um sentimentos ruim, existe uma mistura de orgulho aí no meio. Orgulho de estar do lado do bem, orgulho de estar na luta, orgulho de mostrar para a minha comunidade que sim, estou revoltado e você deveria estar também.

E é complicado, porque nada disso é errado. E, de fato, não existe outro sentimento possível diante da barbárie assassina que é este governo. Mas o Bolsonaro surfa na onda do nosso ódio, ele tem especialistas ao lado dele de transformar nossa revolta em combustível para os apoiadores.

Desconfio que uma das coisas que colocou ele naquela cadeira foi a força da nossa indignação, que num efeito rebote acabou dando importância ao que em épocas normais seria só um maluco retrógrado.

E nesse mar de coisas terríveis acontecendo, nada mais tem importância o suficiente. Como se para diminuir um crime se cometem vários outros, na chamada necropolitica.

E a gente…

A gente está se corroendo por dentro. Exatamente como eles querem.

E também acho que existem alguns poucos lugares de combate. O grupo do ZAP da escola, onde existem perfis de diferentes espectros políticos marcando presença. Onde volta e meia aparecem umas babaquices, mas que também atraem contraargumentos, que são importantes, para eu ver que não estou sozinho. Ou o pai de uma amiga, que está lá, todo dia no grupo do condomínio desmentindo fake news. São espaços de combate, onde a gente sabe que não vai convencer os quinze mais vocais do outro lado. Mas onde tem 50 silenciosos que nunca diz nada, apenas observam. Nem que seja para dizer, ó, membro silencioso do grupo, você não está sozinho.

Mas isso desgasta. Passar anos indignado cansa. Lutar o tempo todo cansa.

Por isso que a gente precisa do autocuidado. Que não é salão, pedicure, fim de semana em Búzios em plena pandemia. Autocuidado é escolher suas batalhas, não dá pra lutar todas. Autocuidado é conseguir ter um espaço seguro, nem que seja na sua família, ou numa série, num livro, onde se possa, pelo menos um pouquinho, deixar as armas de lado.

Porque, como disse o Eduardo Fernandes, a pandemia vai passar. O Bolsonaro vai passar. E vamos precisar ser capaz de abandonar padrões que não nos servirão mais.

O risco é desaprendermos a dialogar com ideias em conflito, com nuances, com meios termos. Porque vamos precisar dessas habilidades para sair dessa e reconstruímos depois.

A música de hoje é “Rock and Roll“, do inigualável Nando Reis.

\---

Você pode receber os áudios do Egotrip para ouvir diretamente em seu celular, pelo Telegam ou Whatsapp. Ambos os grupos são listas de transmissão, ou seja somente eu posso enviar mensagens.

Link no Telegram https://t.me/rodrigovk_egotrip
Se você preferir no whatsapp: https://chat.whatsapp.com/LtnfyGVcEodBAwLw7X8UjV
Se você ouve podcasts, você encontrar “Rodrigovk – Egotrip” no seu agregador de podcasts favorito, como Pocket Casts, Spotify, ou Anchor.fm.
Se você prefere ver em vídeo, o caminho é ali pelo Youtube ou Instagram em @rodrigo_vk

Receba os próximos textos por e-mail:
 

    Fazer um comentário