Rodrigovk
Escritor, faz-tudo, editor e pai

Crescer para onde?

Seja água, seja bambu

Desde que escrevi o texto sobre essa coisa louca de publicar na internet, essa selva de números, likes e comparações, recebi respostas lindas. Uma, em particular, acendeu não uma luzinha, mas uma tocha inteira aqui.

Veio da Aline Valek, alguém cujas metamorfoses conteudísticas acompanho há anos (blog, newsletter, zine, podcast, livro!) Antes de mais nada, vai seguir essa mulher.

Ela escreveu:

Gosto das suas Egotrips (…) espiando vc construir coisas, sem aceleração, em silêncio. Vendo aos pouquinhos, ao longo de meses, algo ganhar forma. Acho que isso acontece com a escrita também. Nessa de acompanhar por tantos anos alguém escrever, é possível observar as pequenas mudanças, as rotas inusitadas, o crescimento da visão de autor.

Crescimento no sentido de expansão mesmo. Outra coisa que as redes sociais nos fizeram acreditar é que só é possível crescer pra cima, como a seta ascendente de um gráfico, como uma torre. Mas também é possível crescer para os lados, como um rizoma!

Acredito que somos seres narrativos, as ficções que contamos costuram as teias de nossas vidas. Por isso mesmo, metáforas importam. São os óculos com os quais enxergamos a vida. (Quem nunca usou óculos cor de rosa em começo de namoro?).

Meu primeiro emprego de verdade foi lá em São Paulo, num grupo de comunicação que incluía uma assessoria de imprensa, uma consultoria corporativa e uma das primeiras agências no Brasil a trabalhar exclusivamente com mídias sociais e influencers (que na época ainda nem eram chamados assim).

Num lance de sorte, eu estava na hora e lugar certos para ser… grande? E ainda tinha aquele ego enorme do jovem recém saído da faculdade. O pessoal lá me chamava de “Peixe”, já que eu tinha arrumado aquele emprego por ter um blog sobre marketing chamado “Peixe Fresco”.

Dois anos e uns meses depois, saí da empresa e me mudei para Campinas, para morar com a noiva. Meio que de saco cheio São Paulo, meio que fugindo dessa perspectiva de trabalhar como condenado até virar um grande executivo. Eu não tinha a fibra necessária. Trabalhei em agência pequena, média, ajudei a fundar uma, trabalhei em startup, até o momento em que fui demitido, e resolvi tentar viver de freela.

Ao deixar São Paulo, o diretor da empresa, um executivo que já tinha presidido multinacionais no Brasil, apertou minha mão e disse “você vai ser grande, Peixe. Boa sorte!”

Nunca esqueci dessa frase. Às vezes penso nela. mais do que deveria.

Talvez eu pense demais sobre privilégios porque completo a cartela do bingo. Homem, branco, cis, escola particular, família estável, uma boa faculdade. E mesmo assim… Eu nunca me tornei grande. Como se eu tivesse começado a corrida uma volta na frente de todo mundo, e “nem assim”.

–> Isso sempre vinha à tona na terapia. E talvez devesse parar de trazer essas questões por aqui, a Internet não precisa de mais um homem branco em crise de meia idade.

Tenho várias teorias sobre essa minha “falta de fibra”. Talvez eu não queira estar naquela velha piada: “trabalhe duro, se você der tudo de si, no fim do ano um carro novo espera o seu chefe.” Ou naquela metáfora filme da Disney do pai que só trabalha e não passa tempo com os filhos.

O conceito central do taoísmo é chamado de Wu Wei, que pode ser traduzido como um princípio de não forçar, da não ação, de não forçar contra a sua própria natureza. Em vez disso, seguir o fluxo, encontrar o caminho da não ação que conduz aos melhores resultados, o que também significa não forçar o que EU quero. Não vou me aprofundar nisso até porque meu conhecimento sobre Wu Wei não passa de dois vídeos no Youtube e um texto da Wikipedia, além de meia dúzia de entrevistas na qual Bruce Lee diz “Be water, my friend”.

Eu sei que meu caminho foi pavimentado por escolhas. Mas pensei na narrativa de escolher abrir mão. Abrir mão de ganhar dinheiro, abrir mão de crescer para que eu possa estar mais perto da minha família, dos amigos.
E aí vem a Aline com essa bomba. Eu nunca parei de crescer. Só que em vez de construir prédios altos na Paulista, estou aqui crescendo com minhas plantinhas. Aprendendo coisa pra caramba. Brincando de marceneiro.

Outra coisa que ocupa um espacinho constante na minha mente é o colapso climático. Resiliência vem de diversidade. Um bosque, uma mata, não depende de uma árvore enorme, mas de várias plantas, animais, fungos e bactérias que florescem em equilíbrio. Se qualquer um desses fica grande demais, coloca em risco todo o sistema.

O que me leva a pensar como é bizarro existir gente como Jeff Bezos no mundo.

Crescer para os lados, como um rizoma. Sabe qual é uma das plantas mais difíceis de arrancar do solo? Touceira de bambu. É mais difícil até do que touceiras de grandes árvores. Você precisa de máquinas MotaFoca(R) gigantes para tirar uma touceira de bambu velha do lado de um córrego. E sim, raízes de diversas espécies de bambu são rizomas. Assim como diversos tipos de capins. (E você sabe como é difícil destruir um capim?)

Algumas espécies de bambus chegam a ficar sete anos crescendo embaixo da terra para despontar de uma vez. É o overnight success da natureza.

Metáforas importam.

Talvez essa seja a maior lição sobre a importância da literatura, já que livros trazem metáforas complexas, diferentes daquelas a qual somos bombardeados o tempo todo pelo sistema capitalista, de que se você não é um raiozinho de sol no Instagram, você não vale nada.

Mas às vezes as metáforas importantes vêm de comentários rápidos de newsletter.

Talvez você seja um bambu. Talvez um fungo consumidor de literatura mandando joinhas e emoticons com olhinhos de estrelinha para suas autoras favoritas. Relações são simbióticas, talvez a autora precise dos seus 🤩🤩🤩 na hora certa para conseguir terminar o romance.

Crescer é importante. Mas a gente não precisa crescer do jeito que o capitalismo espera. Existem outras formas de crescer.

O que você está aprendendo hoje?

Abraço,
Rodrigo

Foto de Eric BARBEAU na Unsplash

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